Lojas de rua interessam, podem ser muito lucrativas, existem setores tradicionalmente nelas instalados.
As pessoas gostam de padarias nas esquinas e de botecos “pé pra fora” (nada mais paulistano…); chopp logo na calçada, no Rio; galeterias em Porto Alegre; lojas de grife no Leblon ou nos Jardins; supermercados com estacionamentos; o que se passou a chamar de outlets: prédios enormes preenchidos com bancas ou baias, operadas por sublocatários ou cessionários; por aí vai.
Óbvio, nem se pensa mais em imensos magazines em algumas áreas: em São Paulo, gigantescas lojas de departamentos no Centro, como a Mesbla e o Mappin, se tornaram mote de mensagens saudosistas pelo Whatsapp (que, aliás, nem existia naquela época…). E o que dizer dos prédios em ruas que se transformaram ao longo dos séculos, como a atual Rua do Bom Jesus (a mais bonita do Recife e considerada a 3ª mais bonita do mundo), mas que já foi a Rua do Bode, a Rua dos Judeus, a Rua da Cruz, alterados os usos dados a cada imóvel…
Se o uso do imóvel se atualizou, será que o aluguel (e o respectivo critério de apuração) pago por ele teria permanecido o mesmo? Nem sempre e, adiante-se, nada legalmente obrigaria o apego à fórmula de antanho.
Poderia anos atrás ser inimaginável o aluguel que não fosse estipulado em valor fixo (tantos cruzeiros, tantos cruzados, tantos cruzados novos, tantos vinténs). Mas as pessoas passaram a fixar o aluguel com base no faturamento do locatário (algo bastante usual em shopping centers e crescentemente utilizado nas ruas); a estipular valores variáveis conforme a época do ano (ideal para uma cidade frequentada no verão e quase abandonada no inverno); a implantar modos de apuração conforme a área cujo uso oscile (às vezes a atividade demanda mais espaço, às vezes menos); a ajustar partilha do valor sem divisão física do imóvel (imagine 3 empresas utilizando em proporções diferentes um mesmo espaço).
Ora, as pessoas são criativas e essa inteligência não pode ser impedida. Qual o tratamento legal, no âmbito das locações imobiliárias, da efetivação desse desenvolvimento?
Pois bem. O aluguel nada mais é que a retribuição paga (pelo locatário) pela cessão (feita pelo locador) do uso e gozo de coisa não fungível (no nosso caso, aquele exato imóvel), é o que se apreende do art. 565, do Código Civil.
Haveria alguma restrição quanto à fixação, a estipulação do aluguel? Creio que não, e a Lei das Locações é veemente ao dispor: “é livre a convenção do aluguel”, exceção feita à estipulação em moeda estrangeira (em que a lei das locações, no art. 17, segue a vedação imposta pelo código civil no art. 318, mostrando-se coerente com o sistema legal brasileiro, portanto).
O que existe é proibição no que se refere à vinculação à oscilação da moeda estrangeira e ao salário mínimo, certamente voltada aos reajustes do valor do aluguel, que não se quer que perturbem ou sejam perturbados pela evolução do salário mínimo ou das cotações do Real, até por mandamento constitucional.
Mais do que não existir proibição a quaisquer critérios de estipulação do aluguel, penso existir uma opção legal, na esteira do desenvolvimento social, pela proteção e incentivo às atividades produtivas. Convém citar o professor Alcides Tomasetti Jr., que mostrava como era essencial propiciar às atividades produtivas “uma disciplina verdadeiramente adequada ao desenvolvimento atingido por elas”.
Tratando de inovações contratuais, é sempre relevante perguntar se novas estipulações resistiriam a ataques. Ora, a lei realçou “a intervenção mínima” e até a “excepcionalidade da revisão contratual”, conforme o novo parágrafo único do art. 421, do Código Civil; cujo novo art. 421 – A, faz presumir “paritários e simétricos” os “contratos civis e empresariais”, tudo a enaltecer a quase absoluta liberdade de contratar. Esta é, atualmente, a lei e, portanto, inovações que venham a ser contratadas, resistirão.
Sim, deveremos pensar com maior largueza, a lei traduz o objetivo da sociedade, sendo aplicável conseguintemente nas análises e nas decisões.
Mas, se conclua com prudência: o prestígio à boa fé contratual, à função social do contrato, do negócio, da propriedade, a submissão às cláusulas gerais do Código Civil, tudo deve ser respeitado. Entretanto, tal se faz e fará com maior abertura às novidades contratadas, sua apreciação aberta e sem preconceitos, deixando-se no passado aquele rançoso apego ao que se fez, para se olhar com boa vontade ao que se faz e ao que se fará.
Hoje, pode ser dito que os contratos de locação merecerão mais amplas construções intelectuais da parte de seus redatores, e permitirão – sem ranço – a expressão e o trato com segurança jurídica das novas pretensões, das novas ideias dos contratantes.
Artigo originalmente publicado no site www.imobireport.com.br, em 17 de Maio de 2023.
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